terça-feira, 17 de março de 2009

O Anacronista


António, vamos chamar-lhe assim, era um jovem diferente. De origens humildes, Freixo de Espada à Cinta, terra de paz, amizade e bezerros. Tó era especial, didn't feel pressure, mas também didn't feel pretty much anything, ou se calhar sentia demais. O mundo passava-lhe ao lado, fogão eléctrico parecia-lhe demasiado moderno, tanque de lavadeira era mais a sua onda.
No fundo o Toninho sabia que havia algo mais além, ou algo algo mais áquem segundo definição geral. O seu sonho não era o futuro, era o passado. Fogo, cavernas, deuses, castelos, iluminação faziam sentido, honra parecia certo. No âmago, penso que apenas o mundo real não tinha significado. Mas não fazia mal, António era um sonhador. E sonhava, não com carros voadores, viagens ao espaço ou super-heróis, sonhava com Viriato, Afonso e João, sonhava com Miguel, Leonardo e Rafael, idealizava Ludwig, Frédéric e Giuseppe. Mas pelo travesseiro também passeavam Diego, Edson e o Zé, aquele que um dia chamaram da Europa. Vendo bem acho que António apenas sonhava.
Prometera a si próprio nunca perecer a sua infância, tão formosa tinha sido como início de tudo, não só do sonho como também do real, esbatida a diferença entre conceitos tão próximos.
Mas o gajo cresceu, viu, ouviu, sentiu e descobriu. Também aprendeu, umas coisinhas como gostava de contar ao pessoal lá do sítio, e viu tanto, mas esse tanto era ainda ainda demasiado pouco para aquilo que sempre sentiu. Fui grande, fui pequeno, hum...acho que fui enorme, não interessa mas o António sempre reconheceu em si que sabia mais, que viu mais, que sentiu mais e que descobriu mais. É algo muito pessoal, e acho que a dada altura todos sabemos se tudo é novo ou apenas uma continuação de qualquer coisa antes vivida. Pelo menos era assim que ele o sentia, e não havia mal nenhum nisso, até era um exercício mental interessante e um teste à sua própria integração no mundo. Ao menos ele sabia o que lhe era querido, honra, amor, lealdade. Há que admitir que não eram os piores valores do mundo.
A história do António ainda ele a está a viver, mas ele também me disse que, tal como o passado lhe diz o que ele é, também o futuro fala com ele e diz-lhe o que será, e ele vive bem com isso, acreditando no passado o futuro não lhe parece tão confuso, podia ser pior, o António tem esperança...